Togo lá dentro

Foi no intervalo do excitante Estónia x Portugal que a minha vida sofreu a mais dramática das voltas (mais dramática até que a Volta de 1970 ganha pelo Joaquim Agostinho). Desde as primeiras horas da manhã que tinha reparado no comportamento atípico dos meus progenitores, indiciando claramente que algo estaria para acontecer. Estando o meu irmão em Vale de Judeus a cumprir pena por homicídio na forma tentada (nunca conseguiu acabar nada na vida, o incompetente), só podia ser algo a ver comigo. Dito e feito.
“7, querido, chega aqui aos papás”. Ui. A última vez que usaram de alguma meiguice para comigo foi para me gamarem o dinheiro do L1 que depois reinvestiram numa quarta de cavalo.
“Temos uma coisa muito importante para te contar”, disseram com o mesmo tom com que me confessaram ter enterrado viva a minha avó para lhe ficarem com a pensão de invalidez.
“Tu na verdade não és nosso filho. Trocámos-te há uns anos no Martim Moniz por um carregador Nokia dos fininhos. E não és português, és togolês.”
De repente tudo passou a fazer sentido. As peças do puzzle encaixaram como a sola da bota do Gattuso no perónio do adversário. Estava explicado o porquê do meu tom de pele imune a escaldões nas férias nas Avencas, o meu cabelo encaracolado à microfone, a alcunha “Bombeiro Voluntário” ganha no balneário das aulas de ginástica, o meu ódio à malta do Burkina-Faso e o facto de fazer os 100 m que vão da minha casa ao quiosque do senhor Abílio em 9,87 segundos.
No entanto, depois de tantos anos apartados da minha Pátria Mãe, sinto que tenho uma dívida para com ela. E todo o tempo é pouco para a saldar. Assim sendo, de hoje em diante exaltarei neste blogue as virtudes futebolísticas do meu país. Tudo farei para que de Tavira a Chaves haja uma bandeira do Togo em cada janela. Porque duvido que Portugal vá à África do Sul. Porque o Carlos Queiroz é o maior tédio do futebol português desde o Carlos Queirós. Porque sou togolês desde pequenino. E porque o Adebayor é muito melhor que o Edinho.